A Existência de Deus é, dentre todos os Princípios Fundamentais da Doutrina Espírita, o que é primeiramente examinado, tanto que O Livro dos Espíritos, obra que abre a Codificação Kardecista (18/04/1857), apresenta no seu primeiro Capítulo, nas questões do nº 1 ao 16, um estudo sobre Deus.
A questão nº 1 elencada é justamente esta:
1- Que é Deus?
R. “É a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”.
Essa estruturação tem uma razão de ser. Como diz o Codificador:
“Sendo Deus a causa primeira de todas as coisas, o ponto de partida de tudo, o eixo sobre o qual repousa o edifício da criação, é o ponto que importa considerar antes de tudo”. (Gênese, Cap. II, Item 1).
Os outros princípios fundamentais, como, por exemplo, a Existência e Sobrevivência da Alma, Reencarnação, Justiça Divina (em que se inclui a Evolução do Espírito e a Lei de Causa e Efeito), e os demais, derivam necessariamente desse primeiro princípio pelo motivo já exposto.
Nesse primeiro capítulo de O Livro dos Espíritos, além da definição registrada acima, temos, meridianamente, de modo a não deixar dúvidas, as duas formas de comprovarmos a existência de Deus: a primeira, racionalmente, através do axioma todo efeito tem uma causa (todo efeito inteligente tem uma causa inteligente); a segunda, pelo sentimento instintivo da sua existência.
Mais adiante, depois de afirmar que, no nosso atual estágio evolutivo, não podemos conhecer Deus em essência, porquanto nos falta um sentido, que conquistaremos através do aperfeiçoamento espiritual (“Bem-aventurados os puros de coração, pois verão a Deus face a face”), o mencionado estudo nos introduz no conhecimento dos Atributos Divinos: Deus é Eterno, Imaterial, Imutável, Único, Onipotente, Soberanamente Justo e Bom. Deus possui as perfeições em grau infinito!
Certas crenças, como a das penas eternas, em que os pecadores padeceriam num inferno de crueldade, às vistas impassíveis de anjos “clementes”, encontram-se irrefragavelmente em oposição ao atributo divino da Soberana Justiça e Bondade de Deus.
Vejamos: a justiça humana, na maioria dos países, aplica ao criminoso pena proporcional à gravidade do delito, e, após, por mais grave tenha sido o crime, devolve-o à sociedade, dando-lhe nova oportunidade do convívio social. Por que a Justiça Divina seria mesquinha, inferior à do homem, não concedendo ao culpado a oportunidade de se redimir? Por que Deus, com sua Onipotência e sem se consternar, submeteria a penas eternas, superlativamente dolorosas, desproporcionais, seres frágeis, nascidos em ambientes geralmente hostis, mas com uma perfectibilidade a conquistar? (“Sede vós pois perfeitos, como é perfeito o vosso Pai que está nos Céus” – Jesus – Mt. V, 48)).
O poema que apresentamos a seguir, da autoria de Benedito Godoy Paiva, do livro “O Espiritismo e as Igrejas Reformadas”, de Jayme Andrade, muito bem retrata o absurdo dessas impiedosas penas:
O JUÍZO FINAL
Sentado o Pai Eterno em trono refulgente,
o olhar severo envia a toda aquela gente!
Alguns anjos cantam e outros vão levando
para a figura austera desse Venerando
as almas que da tumba emergem assustadas,
vendo o Tribunal solene em que serão julgadas.
Dois grupos são formados, um de cada lado:
o da direita Céu: o da esquerda Averno;
e Satanás, num canto, com o chifre fumegante,
espera impaciente, impávido, arrogante,
a “turma” que levará para o inferno.
Aconchegando o filho, a alma bem-amada,
e que na terra foi algo desassisada,
uma mulher se chega e a sua prece faz,
rogando ao Pai Eterno livre do inferno
o seu pobre rapaz.
Cofia o Pai Eterno a longa barba branca
e ajustando os óculos à ponta do nariz,
dirige o seu olhar à pobre desgraçada
e de forma compassada Ele lhe diz:
“Os anjos vão levar-te agora ao Paraíso
e dar-te a recompensa, o teu descanso eterno.
Ali desfrutarás felicidades mil,
porém teu filho mau, este irá para o inferno.”
Um anjo toma o moço e o entrega a Satanás;
porém a pobre mãe ao ver partir o filho,
aflita corre atrás!
E ao incorporar-se às hostes infernais,
eis que grita o Pai Eterno em tom assustador:
“Mulher, para onde vais?!!!”
E o que passou-se, então,
ninguém esquece mais:
“Eu vou para o inferno, ao lado do meu filho,
e repartir comigo a sua desventura!
As lágrimas de mãe, as gotas do meu pranto
acalmarão no inferno a sua queimadura!
“Eu te deixo para ti esse teu Paraíso,
essa mansão celeste onde o amor é surdo!
Onde se goza a vida a contemplar tormento,
onde a palavra amor represa um absurdo.
“Entrega esse teu Céu às mães desalmadas, vis,
que os filhos já mataram para os não criar,
pois só essas megeras poderão, no Céu,
ouvir gritar seus filhos sem se consternar!”
“Desprezo esse teu Céu! O meu amor é grande!
Imenso! Assaz Sublime! E posso te afirmar
que se não te comove o pranto lá do inferno,
e os que no Averno estão são todos filhos teus,
o meu amor excede o próprio amor de Deus!”
E ante o olhar estupefato do Pai Eterno,
a mãe beijou o filho
... e foi para o inferno...!
Osvaldo Ourives
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